terça-feira, 18 de maio de 2010

Gigantes do Ibitiraquire - parte 2

Cansado de ficar deitado e sem dormir, comecei a me levantar cerca de oito da manhã. Escutando o barulho do zíper do meu saco de dormir o Pedro levantou na mesma hora. A noite foi desconfortável tanto pra mim quanto pra ele. Me virava o tempo todo buscando uma posição cômoda pra dormir mas o solo irregular e inclinado não ajudava nada. Isso não me incomoda tanto assim na montanha, pelo menos não por três noites, mais que isso já fica complicado.


Olha a Torre da Prata lá, que animal!


Começamos a preparar nosso café da manhã, pizza de frigideira! Rapaz que maravilha, comemos feito sultões, um verdadeiro banquete na montanha, ao ar livre e com tempo bom! Comemos, comemos e comemos. Encher a barriga antes de caminhar é garantia de energia nas pernas pra caminhada que se seguiria.


Pouco antes da Pizza!



Tudo no Brasil acaba em pizza mesmo!


Quando olhamos a hora já era bem tarde, passava das 09:00h! Limpamos tudo, organizamos tudo dentro da mochila e capa de chuva e escondemos nas caratuvas que ali há. Começamos a caminhar às 09:30h. Nosso destino neste dia era o longinquo Pico Ferraria. Com 1.754 metros de altitude ele desafia muitos que não ousam tentar seu cume. Já escutei tantas estórias sobre o Ferraria assim como escutei do Ciririca. Não posso dizer que confirmo nenhuma delas.

Descemos por uma trilha bem aberta e muito bem marcada com fitas, passamos pelo ponto de água que o Pedro fora na noite anterior buscar água, estávamos em outra floresta nebular super agradável de se caminhar. Nem precisávamos prestar muita atenção à trilha de tão aberta, conversávamos o tempo todo.

Mas, alegria de montanhista na Serra do Mar não dura muito mesmo. Chegando ao colo que liga as duas montanhas encontramos uma quiçaça chatinha. Trata-se de uma sequência de cerca de 300 ou 350 metros de trilha onde predomina bambú fogo e bambú tradicional caído sobre a trilha, fazendo uma verdadeira malha (ou teia) que literalmente se agarra em tudo. Em três pontos cujo trajeto não passa dos 5 ou 6 metros de trilha, o único jeito é se deitar e ir como um soldado mesmo, se arrastando. Foi o que fizemos com gosto, rindo e sem reclamar, ainda parando pra fotografar e comer BIS debaixo da malha! ahahahahhaa


Onde está Wally?


Na ída, durante o último trecho de se arrastar, o Pedro resolveu deixar sua mochila ali pois agarrava muito. Afinal de contas, não sabíamos quanto mais daquela quiçaça encontraríamos pela frente, seria mesmo um saco ele ficar preso a cada 3 metros de trilha. Ali era terreno novo para nós dois. Deixou a mochila e marcou o ponto no GPS. Seguimos adiante e ironicamente aquele era o último trecho de bambuzinho e de vida de milico. A trilha se reabriu em uma floresta delicadamente fantástica, com árvores altas que impediam a entrada da luz do sol, deixando o ar bastante úmido e a caminhada mais que agradável!

Na saída deste último trecho chato, entrada da linda florestinha, demoramos uns cinco minutos pra ver a trilha que parecia ter desaparecido, mas encontramos dez metros acima, e nela continuamos sem problema algum, sempre seguindo a trilha muito bem definida e marcada com fitas. Uma janela entre a copa das árvores se abriu e pude ver o céu, totalmente nublado. Comentei com o Pedro que o tempo me preocupava e ele me respondeu "também estou preocupado", mas, estávamos muito perto e apesar de estar tudo nublado, não vimos proximidade de chuva. Ventava bastante.

Com a mesma tranquilidade que subimos chegamos ao trecho de rocha, uma pequena passagem de chaminé pra continuar. Só tirei a mochila pra facilitar e fomos embora. Cinco minutos depois estávamos no cume do Pico Ferraria, desviando dos formigueiros que lá montam guarda. Levamos no total desde o primeiro cume do Taipabuçú 2h e 40m até o cume do Ferraria.


Eu no cume do Ferraria.



Pedro no cume do Ferraria.


O céu estava nublado, porém nuvens bastante altas, o que significava que nossa visão não foi em nenhum momento limitada e, que podíamos ver tudo lá de cima, até o mar! Visibilidade realmente muito boa, um ângulo quase nunca visto do grupo do Pico Paraná, de onde predomina a parede do Pico Ibitirati e seus 600 metros de rocha. A norte víamos o Pico Ferreiro, ainda menos frequentado. Mais ao norte e um bocado mais distante a Serra do Capivari. Entre o Pico Paraná e Camelos de um lado e Ciririca do outro, despontava como uma ilha o pico Torre da Prata, que montanha linda! Me inspirou desejos de voltar ao Paraná por lados que ainda não pisei!


Panorâmica de parte da vista do cume. Destaque para: Grupo do PP, Agudo de Cotia, Ciririca, Taipabuçú (primeiro plano), Caratuva, Tucum e Camapuan.


Fizemos fotos de cume, apreciamos um pouco a vista, assinamos e lemos o livro de cume. A visitação do Ferraria é mesmo limitada a um leque bem seleto de montanhistas. Folheando o caderno, vimos poucas pessoas diferentes e muitas repetições de ascenções! Élcio Douglas assinou pela última vez colocando "26ª vez"!

Começamos a descida ainda impressionados como fora tranquilo chegar a este cume. Acredito que a melhor forma seja a que fizemos, passar uma noite no Taipabuçú pra subir a montanha, é menos desgastante e maximiza as chances de cume antes de mudança de tempo. No máximo um pernoite no Caratuva. Julio, para a próxima vez, iremos pelo caminho "onde a criança chora e a mãe não ouve"! Faltou você cara! risos

Pois bem, voltamos pelo mesmo caminho sem errar, pegamos a mochila, atravessamos todos os bambús já conhecendo o mapa da mina. Começamos a subida do Taipabuçú com o cansaço já batendo às portas (minhas). Sem desanimar e sem ligar pras dúzias de ferimentos e hematomas, continuei curtindo a aventura e esquecendo dos problemas que a vida social contemporânea nos dá de presente.

Após pouco mais de 2h de subida chegamos ao terceiro cume do Taipa e de lá seguimos ao primeiro onde deixamos nossas coisas. Sobraram duas linguiças do primeiro pacote aberto no café da manhã, decidimos então fazer o miojão de camarão com uma linguiça picada pra dar um sabor diferenciado no instantâneo.

Descansamos um pouco, comemos, nos hidratamos, juntamos as tralhas e começamos a descer a trilha. É engraçado como a hora passou quando sentamos no cume do Taipa de novo para este descanso...Olhei pro relógio e já marcava 16h! Incrível! A nossa idéia foi óbvia, seguir pela trilha que vem margeando o Caratuva por baixo ao invés de subir novamente seu cume. Essa picada foi aberta pelo Júlio e pelo Élcio tempos atrás. Entretanto continua bem aberta apesar de pouco frequentada.

Descemos e conforme entramos na floresta a luz do sol se foi com a copa das árvores, ainda era 16:30h e já era quase noite dentro da floresta na encosta do Caratuva. Continuamos sem nenhuma parada até a bifurcação trilha Getúlio - PP. Ali sentamos por 1 minuto, eu já estava bem cansado e Pedro aparentava estar muito mais disposto. Seguimos até a bica, ali tivemos que parar novamente pois precisávamos de bastante água para cozinhar já que carne seca exige pelo menos duas fervuras pra tirar o sal.

Agora sim, ficamos mais pesados e o cansaço pegou os dois. Seguimos caminhando e a hora avançava mais rapidamente, saindo da bica da trilha do PP era cerca de 17:25h, já não havia mais sol, lanternas pra continuar dali. Chegamos na bifurcação do Pico Itapiroca as 18:00h já completamente no escuro.

Apesar de estar escuro, a trilha é uma avenida de tão aberta e o desnível é bem pouco, já que a bifurcação fica a 1.660 metros de altitude e o cume do Itapiroca tem 1.805 metros, o acampamento, mais baixo ainda: 1.762 metros. Tínhamos que vencer apenas cem metros de desnível até o acampamento e mesmo assim foi bem cansativo.

Depois de meia hora chegamos lá, já era 18:30h, não víamos nada além da cidade de Paranaguá bem iluminada. Montamos a barraca, esvaziamos as mochilas e começamos a dar um look de acampamento. De repente notamos um fenômeno muito legal de se ver. Um mar de nuvens se formou nos vales, prenchendo tudo e tampando toda visão abaixo de si. Paranaguá não podia mais ser vista e a camada de nuvens começou a subir rapidamente, logo cobriu o Pico Camelos e começou a entrar para os lados do rio Cotia. Era uma visão indicativa de entrada de frente fria, confirmando a previsão do tempo que o Hilton deu pro Pedro via celular. Mesmo assim, ficamos abestados observando aquele Ballet sob nossos pés!

Luzes indicavam que o A2 do PP ainda abrigava campistas. Voltamos nossa atenção ao 39° jantar da montanha, que teria um PF com gostinho de comida da vovó: Arroz carreteiro com carne seca cozida! As comidas na montanha estão ficando cada vez mais elaboradas he he he. Ainda faço um assado hein!

Lambemos os dedos e entramos na barraca bem cansados, eu já cheio de dores musculares tomei dorflex pra aliviar e conseguir dormir tranquilo. Dormimos. Acordei pouco depois das 3 da manhã e não consegui dormir mais. Que coisa! Preciso dar um jeito na minha ansiedade na montanha, me tira noites e noites de sono!

Fiquei olhando o relógio esperando a hora passar e percebi gotas de chuva pouco depois das cinco e meia da manhã. Logo parou. O relógio despertou no horário que pretendíamos ver o nascer do sol, em vão, abri a barraca e não via vinte metros a frente! A frente fria chegou mesmo. Começou a chover e não parou por uma hora.


O Ciririca sempre vestindo a camisa de montanha mítica! Que imagem sombria!



Tá com sono Pedro? kkk


Quando a chuva aliviou nos levantamos e decidimos na mesma hora abortar a esticada de ataque até o Pico Paraná. Desceríamos sem sequer tomar café da manhã pois água começara a se acumular no terreno onde estava a barraca. Enquanto o Pedro juntava as coisas na mochila eu disse "Meu, já tô aqui, vô no cume do Itapiroca, sabe lá quando vai ser a outra chance meu?! É ali!". E lá fui eu aos sons das risadas do Pedro e sob chuva (risos). Sim, estava chovendo!


Tá na chuva é pra se molhar.


Levei uns seis ou sete minutos pra chegar no cume, olhei ao meu redor e desci pra rocha no falso cume onde fica a caixa do livro que não abri. Ali fiz um vídeo e voltei pra barraca em mais cinco minutos, fui bem rápido.

Terminamos de empacotar tudo e começamos a descida às 09:15h. Felizmente a chuva parou exatamente no momento que fechamos a mochila. Não podíamos ter pressa, trilha molhada, rochas escorregadias, um tombo e uma fratura estão ali olhando por detrás daquela moita, pisemos em ovos...

Uma eternidade de volta. Terreno que não acaba nunca! Chegamos na bifurcação e entramos no Getúlio, caminhamos sem pressa, sem preocupações, sem chuva! No topo do Getúlio o Pedro viu na trilha uma pequena lesma, uns 4 centímetros. Sorte! Passei a viagem toda sem uma foto de um amiguinho pequeno, eis minha chance. Fotografei e seguimos.


Mais uma lesma pra minha lista de lesmas fotografadas. Essa tinha até neon na saia, tunada!


Chegamos na fazenda do Dilson às 11:25h, só havia um carro além do carro do Pedro, sinal de que aquele pessoal ainda estava no A2 ou retornando. Pedro tomou banho, depois fui eu, jogamos tudo no carro e só paramos no Tio Doca pra comer.

Diálogo comédia entre o Pedro, uma menina do Tio Doca e eu:

Pedro: -Qual é o esquema do preço?
Menina: -Temos a opção de buffet a R$ 14,00, opção de rodízio a R$ 15,00 (pausa)
Menina: -Também temos a opção de Pratão a R$ 12,00 com arroz, feijão, salada e uma carne que pode ser frango, contra filet ou alcatra.
Parofes: - Porra Pedro, rodízio!
Pedro: - ahahahahah fecha com chave de ouro e come direito pô!
Parofes: - O que é um peido pra quem tá cagado?!

Democraticamente optamos pelo rodízio! A comida era mesmo muito boa, ainda mais saindo da montanha e pegando o pacote pronto, sem ter que conectar fogareiro ao gás, buscar água, cozinhar, comer, mijar, cagar, lavar a louça na água gelada da montanha...

Fomos pra Curitiba, passamos na casa do Pedro só pra eu vestir minha bermuda jeans seca e depois ele me deixou na rodoviária as 14:54h, peguei o ônibus das 15:00h pra SP!

O que dizer deste final de semana? Melhor e mais engraçado impossível...

Abraços galera!

Parofes.

14 comentários:

George Volpão disse...

Muito massa a trip! Fez-me lembrar dos velhos tempos de caminhadas com mochilas cheias de rango naquelas bandas. Hj sou apenas um pobre corredor de trilhas, mochilas só para viagens, rs.

O rodízio do Tio Doca é dos melhores do Brasil! Mas algo também mudou e hoje sou (com orgulho) vegetariano.

Abraço!

tacio philip disse...

Legal!!! Comer bem é requisito básico. Eu corto peso pra caramba, mas nunca deixo de levar meu tostex :-D Essa pizza de frigideira também está nos meus planos, outro dia estava vendo no supermercado. E rodízio depois de dia de trilha ou escalada é a melhor pedida! A minha mais recente foi voltando do cuscuzeiro, puta rodizio animal na estrada perto de analândia! :-)))
Abs!!!

Pedro Hauck disse...

Cara, ficou muito batuta o relato. Já estou com saudades de voltar pra Serra, vou esperar essa frente fria passar e me mandar pra lá denovo... preciso de serra....

Unknown disse...

Gostaria muito de ter acompanhado vocês e tenho saudades do Ferraria. Na próxima não vou faltar e você vai ver que vindo do litoral a coisa fica bem melhor, justificando a fama da montanha. Abração

Paulo Roberto - Parofes disse...

Justo! rs
Na próxima estaremos lá!
Abração!

Esdras Daniel disse...

Irado o relato Parofes, deu até vontade de encarar a serra, o problema é que toda vez que eu vou no paraná rola algum acontecimento que me impede de escalar até via esportiva, o que dirá subir as montanhas hehehe

Paulo Roberto - Parofes disse...

Fala George, precisa voltar pras montanhas cara!
Abs

Daniel, faça seu tempo. Pro Paraná tem que ficar atento a previsão mesmo e mesmo assim ela falha kkk
Abs!

Paulo Roberto - Parofes disse...

Tacio,

Aqui em SP essa pizza se chama Rap10, é gostoso pacas kkkk

Abs!

Beatriz disse...

muito lega essa trip de vcs!! tô pretendendo ainda neste semestre tirar uns cinco dias de férias pra conhecer esses picos do paraná. a propósito de aventura, nesse findi, me meti numa roubada sinistra!! ainda esta semana posto no blogue e tu vai ficar a par! abração.

Unknown disse...

Legal a trip de vcs dois,nesse ano também pretendo ir ao Ferraria e Taipa,bom relato e ficou bacana a foto da lesma ´´tunada``

Wéll Bericat disse...

Muito bom o relato Parofes, ja usei essa massa para fazer panqueca de nutela e morango (na montanha tambem é claro..rsrsr) que fica show de bola tambem
Abç

Paulo Roberto - Parofes disse...

Pessoal,

De ontem pra hoje o blogspot deu pau, alguns comentários foram perdidos mas agradeço aqui ao Well Bericat e ao Marumbista 82 pelos comentários. Recebi o e-mail pra liberação do comentário mas depois que liberei dava uma mensagem de erro do blogspot.

Abraços e valeu!

Paulo

Gabi disse...

Bonito reportaje.
Un saludo desde el otro lado del charco.

Jefferson Luis Bellenda disse...

Nossa as fotos estão demais, vi também as fotos do blog do Pedro. Quero fazer algumas destas montanhas também. Suerte